#Opinião 01: Internacionalização e nova globalização na educação privada no Brasil.

Luiz Henrique Santana
3 min readApr 25, 2024

A educação privada convive com booms ou modas. “Metodologias Ativas”, “Educação 4.0”, “Educação Digital”, são termos que viram parte do que o mercado da educação privada usa para legitimar e justificar a relevância relativa de produtos para o monitoramento da vida escolar, gestão pedagógica e financeira, e, entre muitas outras atribuições que vão da administração das cantinas ao inventário da brinquedoteca, iniciativas com intenções pedagógicas claras. Escolas bilíngues se popularizam Brasil a fora com promessas de ensinar línguas estrangeiras modernas (mas ainda predominantemente o inglês) como uma segunda língua “quase”-nativa.

Sempre me chama a atenção o esforço de um país com fronteira com 10 países e apenas um deles com o inglês como língua oficial, a Guiana (com população de menos de 1 milhão de habitantes e, a despeito de um crescimento rápido e recente por um boom decorrente da descoberta de reservas de petróleo, ainda com importância econômica infinitamente menor do que parceiros como Argentina, Paraguai e Uruguai, por exemplo. Mas essa surpresa, claro, é mais profunda que isso.

É curioso que num país com terrível desempenho em diversos indicadores educacionais internacionais, mesmo entre escolas privadas, optamos por atacar um problema alheio a alfabetização, letramento numérico, científico e tecnológico para focar energia e recursos em produtos de educação bilíngue que, com enorme frequência, dedicam pouco tempo para formação de professores e construção de uma comunidade verbal que comungue não apenas de uma língua franca, mas de valores e práticas (como a leitura, a crítica e a resolução propositiva e sistemática de problemas) que de fato identifiquem estes “projetos” de educação bilíngue com alguma parte do legado histórico da República das Letras com a qual a comunidade intelectual se identifica há quase cinco séculos. Sem contar o enorme desacoplamento que persiste entre estas propostas de ensino e os objetivos da Educação Básica, como pensada na LDB e nas mais recentes BNCC’s, por exemplo.

Quão curioso me deixou ver vários stands na principal feira de inovação em educação da América Latina, a Bett Educar, dedicados à propostas pedagógicas com “modelo finlandês”, “credenciada nos EUA”, ou com linhas de intercâmbio direto com outros países do Norte Global. Um novo “diferencial de mercado”, sem dúvida. Ainda que um diferencial sustentado por que critério e que evidências pedagógicas relevantes?

De frente com mais aventuras pedagógicas neste mercado da educação privada, eu me pergunto quanta análise de processos e efeitos existe nas decisões de mantenedores, diretores e outros responsáveis por estas decisões comerciais-pedagógicas? Quanta análise operacional e quantitativa (essência do método científico e da educação básica em sua essência nos projetos de nomes famosos como Binet, Simon, e muitos outros) está na base dos clientes dessas jovens e (não duvido) entusiastas empresas que vendem internacionalização e globalização como valores, ou pelo menos como “valor agregado”?

Este texto é apenas um estranhamento fruto de um primeiro contato. Uma primeira impressão. Espero ser positivamente surpreendido por um pouco mais de estudo e escuta. E vou me abrir a estas duas práticas como se deve, pela dúvida cética e sistemática. O legado que sustenta boa parte, se não todas as boas decisões, na educação, na ciência e na vida.

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Luiz Henrique Santana

Neuropsicólogo e Neurocientista. Divulgador Científico. Poeta de quinta. Bailarino de terceira. Tentando ser um pai de primeira.